Mirar em algo e acertar em coisa diversa. A descoberta de provas ao
acaso tem sido valiosa para as autoridades policiais desvendarem a ação
criminosa. Um exemplo recente é a operação Lava Jato.
Seu
objetivo inicial era desarticular quatro organizações criminosas
lideradas por doleiros. O nome da operação vem do uso de uma rede de
postos de combustíveis e de lava a jato de automóveis para movimentar
recursos ilícitos pertencentes a uma das organizações investigadas.
No
curso das investigações, o Ministério Público Federal recolheu
elementos que apontavam para a existência de um esquema criminoso de
corrupção envolvendo a Petrobras – segundo o MPF, é a maior investigação
de corrupção e lavagem de dinheiro a que o Brasil já assistiu.
O
fenômeno chamado de serendipidade consiste em sair em busca de algo e
encontrar outra coisa, que não se estava procurando, mas que pode ser
ainda mais valiosa. A expressão vem da lenda oriental Os três príncipes de Serendip, viajantes que, ao longo do caminho, fazem descobertas sem ligação com seu objetivo original.
Objeto claro
O
sigilo das comunicações telefônicas é garantido no inciso XII do artigo
5º da Constituição Federal, e para o seu afastamento exige-se ordem
judicial que, também por determinação constitucional, precisa ser
fundamentada (artigo 93, inciso IX).
No artigo intitulado Natureza jurídica da serendipidade nas interceptações telefônicas, o professor Luiz Flávio Gomes explica que a Lei 9.296/96
determina que a autorização judicial de escuta deve trazer a descrição
clara da situação objeto da investigação e a indicação e qualificação
dos investigados.
Mirar em algo e acertar em coisa diversa. A descoberta de provas ao
acaso tem sido valiosa para as autoridades policiais desvendarem a ação
criminosa. Um exemplo recente é a operação Lava Jato.
Seu
objetivo inicial era desarticular quatro organizações criminosas
lideradas por doleiros. O nome da operação vem do uso de uma rede de
postos de combustíveis e de lava a jato de automóveis para movimentar
recursos ilícitos pertencentes a uma das organizações investigadas.
No
curso das investigações, o Ministério Público Federal recolheu
elementos que apontavam para a existência de um esquema criminoso de
corrupção envolvendo a Petrobras – segundo o MPF, é a maior investigação
de corrupção e lavagem de dinheiro a que o Brasil já assistiu.
O
fenômeno chamado de serendipidade consiste em sair em busca de algo e
encontrar outra coisa, que não se estava procurando, mas que pode ser
ainda mais valiosa. A expressão vem da lenda oriental Os três príncipes de Serendip, viajantes que, ao longo do caminho, fazem descobertas sem ligação com seu objetivo original.
Objeto claro
O
sigilo das comunicações telefônicas é garantido no inciso XII do artigo
5º da Constituição Federal, e para o seu afastamento exige-se ordem
judicial que, também por determinação constitucional, precisa ser
fundamentada (artigo 93, inciso IX).
No artigo intitulado Natureza jurídica da serendipidade nas interceptações telefônicas, o professor Luiz Flávio Gomes explica que a Lei 9.296/96
determina que a autorização judicial de escuta deve trazer a descrição
clara da situação objeto da investigação e a indicação e qualificação
dos investigados.
Anteriormente, em 2013, Noronha já havia destacado posição idêntica, de
que o estado não pode quedar-se inerte ao tomar conhecimento de suposta
prática de crime (APN 510). “O encontro fortuito de notícia de prática
delituosa durante a realização de interceptações de conversas
telefônicas devidamente autorizadas não exige a conexão entre o fato
investigado e o novo fato para que se dê prosseguimento às investigações
quanto ao novo fato”, disse em seu voto vencedor.
Crimes diversos
Em
2013, no HC 187.189, o ministro Og Fernandes afirmou que é legítima a
utilização de informações obtidas em interceptação telefônica para
apurar conduta diversa daquela que originou a quebra de sigilo, desde
que por meio dela se tenha descoberto fortuitamente a prática de outros
delitos. Caso contrário, “significaria a inversão lógica do próprio
sistema”.
O caso julgado tratava de denúncia formulada pelo MPF a
partir de desdobramento da operação Bola de Fogo, cujo objetivo era
apurar a prática de contrabando e descaminho de cigarros na fronteira.
No entanto, a denúncia foi por outros crimes – formação de quadrilha e
lavagem de dinheiro. Por isso, a defesa sustentava a ilegalidade das
provas e queria o trancamento da ação penal.
Og Fernandes
asseverou que não houve irregularidade na investigação. “Não se pode
esperar ou mesmo exigir que a autoridade policial, no momento em que dá
início a uma investigação, saiba exatamente o que irá encontrar,
definindo, de antemão, quais são os crimes configurados”, disse.
O
ministro entende que somente se dá início a uma investigação para
descobrir algo que não se sabe ao certo se aconteceu nem como aconteceu.
“Logo, é muito natural que a autoridade policial, diante de indícios
concretos da prática de crimes, dê início a uma investigação e, depois
de um tempo colhendo dados, descubra algo muito maior do que supunha
ocorrer”, concluiu.
Dever funcional
No julgamento do HC 189.735, o ministro Jorge Mussi enfatizou que se a
autoridade policial, em decorrência de interceptações telefônicas
legalmente autorizadas, tem notícia do cometimento de novos ilícitos por
parte daqueles cujas conversas foram monitoradas, é sua obrigação
apurá-los, ainda que não possuam liame algum com os delitos cuja
suspeita originariamente ensejou a quebra do sigilo telefônico.
Já
no HC 197.044, o ministro Sebastião Reis Júnior advertiu que é preciso
haver equilíbrio entre a proteção à intimidade e a quebra de sigilo.
Para ele, não pode haver uma devassa indiscriminada de dados, mas, se a
interceptação telefônica é lícita, como tal captará licitamente toda a
conversa. “Havendo indícios de crime nesses diálogos, o estado não deve
se quedar inerte; cumpre-lhe tomar as cabíveis providências”, declarou.
Participação de terceiro
Ao
julgar o RHC 28.794, em 2012, a Quinta Turma entendeu que a
jurisprudência aceita a possibilidade de se investigar um fato delituoso
de terceiro descoberto fortuitamente, desde que haja relação com o
objeto da investigação original. O caso envolvia a interceptação de um
corréu e resultou em denúncia por corrupção passiva contra esse
terceiro, que não era o objetivo da investigação.
A ministra
Laurita Vaz, relatora, frisou que “a descoberta de fatos novos advindos
do monitoramento judicialmente autorizado pode resultar na identificação
de pessoas inicialmente não relacionadas no pedido da medida
probatória, mas que possuem estreita ligação com o objeto da
investigação”. Tal circunstância não invalida a utilização das provas
colhidas contra esses terceiros, destacou a magistrada em seu voto.
No HC 144.137, o ministro Marco Aurélio Bellizze também reconheceu que a
interceptação telefônica vale não apenas para o crime ou para o
indiciado que constam do pedido, mas também para outros crimes ou
pessoas, até então não identificados, que vierem a se relacionar com as
práticas ilícitas. A investigação tratava de corrupção no Ibama, e as
escutas recaíram sobre um servidor do órgão. Porém, o Ministério Público
ofereceu denúncia por corrupção ativa contra um empresário,
supostamente beneficiado pelo esquema.
“Ora, a autoridade
policial, ao formular o pedido de representação pela quebra do sigilo
telefônico, não poderia antecipar ou adivinhar tudo o que está por vir”,
disse o ministro. Segundo ele, tudo o que for obtido na escuta
judicialmente autorizada será lícito, e novos fatos poderão envolver
terceiros inicialmente não investigados.
Crime futuro
Quando
se tratar de notícia da prática futura de crime, há precedente do STJ
segundo o qual não se deve exigir a demonstração de conexão entre o fato
investigado e aquele descoberto por acaso em escutas legais (HC
69.552). Para o relator, ministro Felix Fischer, além de a Lei 9.296/96
não exigir tal conexão, o estado não pode ficar inerte diante da ciência
de que um crime vai ser praticado, tanto mais porque a violação da
intimidade se deu com respaldo constitucional e legal.
No caso,
as interceptações eram direcionadas a terceiro alheio ao processo, mas
revelaram que uma quadrilha pretendia assaltar instituições bancárias.
Felix Fischer esclareceu que nem sempre são perfeitas a correspondência,
a conformidade e a concordância previstas na lei entre o fato
investigado e o sujeito monitorado.
De acordo com o ministro, a
partir de interceptações telefônicas regularmente autorizadas, pode-se
tomar conhecimento da eventual prática de infrações penais diversas
daquela que deu ensejo à decretação da medida. “Pode ser, também, que
haja a descoberta da participação de outros envolvidos no crime. Enfim,
inúmeras possibilidades se abrem”, completou.
Para Fischer, a exigência de conexão entre o fato investigado e o fato
encontrado fortuitamente só se coloca para as infrações penais passadas.
Quanto às futuras, “o cerne da controvérsia se dará quanto à licitude
ou não do meio de prova utilizado, a partir do qual se tomou
conhecimento de tal conduta criminosa”.
Desmembramento
A
utilização da interceptação telefônica como ponto de partida para nova
investigação foi reconhecida como válida no julgamento do HC 189.735.
Naquele caso, a operação Turquia investigou irregularidades na
importação de medicamentos, mas após meses de monitoramento, concluiu-se
que os suspeitos haviam desistido da ação. No entanto, as
interceptações revelaram relações “promíscuas” de servidores públicos
com a iniciativa privada.
Foi feito, então, o desmembramento do
inquérito para a apuração dessas outras condutas, o que ensejou a
operação Duty Free, com autorização de escutas sobre novos agentes,
supostamente membros de uma quadrilha formada para praticar diversos
crimes que não guardariam relação com os fatos antes investigados na
operação Turquia.
“Perfeitamente possível que, diante da notícia
da prática de novos crimes em interceptações telefônicas autorizadas em
determinado procedimento criminal, a autoridade policial inicie
investigação para apurá-los, não havendo que se cogitar de ilicitude”,
comentou o ministro Jorge Mussi em seu voto.
Sigilo bancário e fiscal
O
encontro fortuito de provas de delitos que não são objeto da
investigação pode ser dar também na quebra de sigilo bancário e fiscal.
No HC 282.096, a Sexta Turma reconheceu a legalidade das provas que
levaram a uma denúncia por peculato, crime que não havia dado ensejo às
quebras.
O relator, ministro Sebastião Reis Júnior, mencionou
que o fato de as medidas de quebra do sigilo bancário e fiscal não terem
como objetivo inicial investigar o crime de peculato não conduz à
ausência de elementos indiciários acerca desse crime.
Busca e apreensão
A Sexta Turma já analisou a
serendipidade no cumprimento de mandado de busca e apreensão. No RHC
45.267, o mandado autorizava apreender documentos e mídias em
determinado imóvel pertencente à investigada, suspeita de receber
propina em razão de cargo público. Ocorre que, no cumprimento da medida,
a polícia acabou apreendendo material que foi identificado como do
marido da investigada.
A polícia, então, ao analisar o conteúdo,
constatou diversos indícios de que ele também teria participação no
suposto esquema, especialmente na lavagem do dinheiro recebido pela
mulher. Assim, a condição inicial de terceiro estranho à investigação se
modificou. Ele passou a ser investigado e buscou, por meio de habeas
corpus, o reconhecimento da ilegalidade da prova colhida no escritório
da residência do casal, onde foi feita a busca.
A decisão da
Sexta Turma foi por maioria (três a dois). A desembargadora convocada
Marilza Maynard, cujo voto prevaleceu, ponderou sobre a dificuldade de a
polícia identificar a propriedade de cada objeto apreendido, uma vez
que a residência era comum do casal, e ali ambos habitavam e
trabalhavam.
Ela também comentou que, em virtude de a perícia
ter encontrado nos documentos apreendidos indícios de envolvimento do
marido, era possível indiciá-lo com base nessas provas.
Flagrante
Em
outro julgamento, também na Sexta Turma (RHC 41.316), os ministros
analisaram um caso em que, no cumprimento de mandado de busca e
apreensão, foram encontrados armas e cartuchos na residência do
investigado, o que deu início a uma nova ação penal.
A relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura, destacou em seu voto que, como o delito do artigo 16
da Lei 10.826/03 é permanente, o flagrante persiste enquanto as armas e
munições estiverem em poder do agente. As provas encontradas
fortuitamente foram consideradas legais.
Fonte: Coordenadoria de Editoria e Imprensa do STJ.
Disponível em: <http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/noticias/noticias/O-encontro-fortuito-de-provas-na-jurisprud%C3%AAncia-do-STJ>. Acesso em: 27-4-2015.
Prof. Me. Giulliano Rodrigo Gonçalves e Silva
Apresentação de conteúdos de interesse dos acadêmicos, monitores, professores, pesquisadores e gestores do Curso de Direito.
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segunda-feira, 27 de abril de 2015
DIREITO PROCESSUAL: o encontro fortuito de provas na jurisprudência do STJ
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