Acompanhando o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão, a
Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do
Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que condenou uma empresa a
indenizar outra por suposto prejuízo gerado pela redução unilateral do
volume de matéria-prima e do prazo de pagamento previstos em contrato
verbal.
O tribunal paulista condenou a empresa fornecedora a ressarcir a
diferença do lucro que sua cliente teria com o fornecimento integral do
insumo entre agosto de 1997 – quando o fornecimento foi reduzido – e
julho de 1998 – quando a relação comercial entre as partes foi
encerrada.
O fornecimento foi reduzido em função de problemas operacionais, e o
prazo de pagamento, por conta do inadimplemento da contratante. O TJSP
entendeu que houve abuso de posição dominante e violação aos princípios
da boa-fé objetiva e da função social do contrato.
A fornecedora recorreu ao STJ sustentando, entre outros pontos, que a
indenização foi imposta com base em dano hipotético e futuro, e que, ao
condicionar o fornecimento normal ao pagamento de dívidas em aberto,
ela não feriu a boa-fé objetiva. Argumentou, ainda, que a Lei 8.884/94
não se aplica ao caso, uma vez que disciplina relações de direito
público e visa a reprimir atos atentatórios à livre concorrência, fatos
inexistentes no caso em questão.
Contrato verbal
Em seu voto, Luis Felipe Salomão discorreu sobre a fragilidade do
contrato verbal e considerou um “descuido injustificável” a manutenção
de pactos desse porte sem forma escrita – o que, embora não retire sua
validade e eficácia, reduz a segurança jurídica e gera futuras
controvérsias.
Isso porque, ressaltou o ministro, o princípio do paralelismo das
formas prevê que o distrato se faz pela mesma forma exigida para o
contrato (artigo 472
do Código Civil), ou seja, um contratante não pode exigir do outro
forma diferente da verbal para a alteração de uma avença não escrita.
Quanto à redução do fornecimento e do crédito após o inadimplemento
das faturas vencidas, o relator concluiu que não se pode impor a um dos
contratantes que mantenha as condições avençadas verbalmente quando, de
fato, a relação de confiança entre as partes se alterou – conforme o
princípio da exceção de inseguridade, prevista no artigo 477 do Código Civil.
“Portanto, era lícito que a contratada reduzisse o volume de produto
fornecido e modificasse as condições de crédito e de pagamento diante do
inadimplemento pretérito da contratante, precavendo-se de prejuízo
maior”, afirmou em seu voto.
Previsibilidade
Segundo o relator, os litígios resultantes de descontinuidades
contratuais não são novidade no STJ, tanto que a corte já firmou
entendimento sobre a licitude da rescisão unilateral desmotivada. Para
ele, embora o caso julgado não envolva ruptura de contrato, mas
alteração dos padrões de fornecimento provocada por problemas
operacionais, não há particularidades que aconselhem julgamento distinto
da jurisprudência dominante.
Salomão reconheceu que o caso não trata de relação contratual de
longa duração, na qual os costumes comerciais têm aptidão de gerar em um
contratante a legítima expectativa de que o outro se comportará de
forma previsível, mas ressaltou que problemas operacionais também são
previsíveis.
“Em se tratando de problemas de produção, tem-se situação
absolutamente previsível para ambos os contratantes, de modo que a
redução no fornecimento de produtos, nessa situação, não revela nenhuma
conduta ilícita por parte do fornecedor”, disse.
O ministro enfatizou que a própria contratante confirmou que a
contratada era responsável por cerca de 70% da matéria-prima utilizada
em sua linha de produção, não se tratando, portanto, de fornecedora
exclusiva. Para ele, “cabia à contratante precaver-se contra oscilações
previsíveis e comuns no fornecimento do produto, sobretudo em avenças de
grande vulto” – que, no caso, seria de 90 toneladas/mês.
Dano hipotético
Luis Felipe Salomão também ressaltou em seu voto que não cabe
condenação indenizatória com base em pedido genérico. Ele reiterou que,
em ação de responsabilidade civil subjetiva, é incumbência do autor
demonstrar, ainda no processo de conhecimento, a ocorrência do dano, a
conduta ilícita do réu e o nexo de causalidade entre a ação ou omissão e
o resultado lesivo.
“A despeito de o julgador poder valer-se de seu livre convencimento
motivado, descabe condenar o réu à indenização de um dano hipotético,
sem comprovação da existência do prejuízo e do nexo de causalidade”,
afirmou o relator.
Além de dar provimento ao recurso especial, a Turma condenou a
empresa contratante ao pagamento das custas processuais e de honorários
advocatícios, arbitrados em R$ 100 mil em razão da complexidade da causa
e da longa duração do processo. A decisão foi unânime.
Fonte: Coordenadoria de Editoria e Imprensa do STJ.
Disponível em: <http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/noticias/noticias/Quebra-de-confian%C3%A7a-dispensa-fornecedor-de-indenizar-cliente-por-altera%C3%A7%C3%A3o-de-contrato-verbal>. Acesso em: 11-5-2015.
Processo de referência da notícia: REsp 1279188
Prof. Me. Giulliano Rodrigo Gonçalves e Silva
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segunda-feira, 11 de maio de 2015
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